quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

RELATÓRIO DA COMISSÃO DA VERDADE PRECISA SER APENAS O COMEÇO


A Comissão Nacional da Verdade entregou na última quarta-feira (10/12, dia internacional dos Direitos Humanos) o seu relatório final em cerimônia oficial no Palácio do Planalto à presidenta Dilma Rousseff. O documento dividido em três volumes, apresenta o resultado de dois anos e sete meses de trabalho da Comissão, criada pela lei 12528/2011.

Em maio de 2012, ela passou a existir com a finalidade de esclarecer as circunstâncias e autoria de graves violações de Direitos Humanos praticadas entre 1946 e 1988 com o objetivo de passar a história do país a limpo. Com a finalização dessa etapa ficou clara a necessidade de responsabilizar as forças armadas pelas atrocidades cometidas durante a ditadura civil-militar iniciada com o golpe de 1964 bem como os setores da sociedade civil que apoiaram o governo militar como os velhos meios de comunicação (PIG) e o empresariado, especialmente, o paulista.

O documento apresenta centenas de nomes de cidadãos mortos e desaparecidos pelo regime de exceção bem como a participação de autoridades nesses casos além de propor medidas institucionais como:
  • 1 - Responsabilização das Forças Armadas."Dado o protagonismo da estrutura militar, a postura de simplesmente 'não negar' a ocorrência desse quadro fático revela-se absolutamente insuficiente";
  • 2 - Fim da prescrição e da anistia dos crimes cometidos.
    "A importância do bem protegido justifica o regime jurídico da imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade e da impossibilidade de anistia";
  • 3 - Ressarcimento.
    "Cabe, em relação a esses agentes públicos, a proposição de medidas administrativas e judiciais que objetivem o ressarcimento ao erário público das verbas despendidas";
  • 4 - Proibição de comemoração do golpe de 64
    "Essa realidade torna incompatível com os princípios que regem o Estado democrático de direito a realização de eventos oficiais de celebração do golpe militar, que devem ser, assim, objeto de proibição";
  • 5 - Valorizar direitos humanos na seleção de membros das Forças Armadas.
    "Reformulação dos concursos de ingresso e dos processos de avaliação contínua nas Forças Armadas e na área de segurança pública, de modo a valorizar o conhecimento sobre os preceitos inerentes à democracia e aos direitos humanos";
  • 6 - Mudança nos currículos das academias militares e policiais.
    "Tal recomendação é necessária para que, nos processos de formação e capacitação dos respectivos efetivos, haja o pleno alinhamento das Forças Armadas e das polícias ao Estado democrático de direito, com a supressão das referências à doutrina de segurança nacional";
  • 7 - Retificação de causas de morte.
    No caso de pessoas mortas em decorre?ncia de violac?o?es de direitos humanos, como Vladimir Herzog e Alexandre Vannucchi Leme, a causa de morte no atestado de óbito deve ser retificada "de modo célere";
  • 8 - Exclusão de informações sobre registros de perseguição política.
    As informações que envolvam registros de atos de perseguição política e de condenação na Justiça Militar ocorridos no período de 1946 a 1988 da rede nacional de segurança devem ser excluídas. A CNV propõe também a manutenção de banco de DNA de pessoas mortas sem identificação;
  • 9 - Criar mecanismos de prevenção e combate à tortura.
    "A tortura continua sendo praticada no Brasil, notadamente em instalações policiais. Isso se deve até mesmo ao fato de que sua ocorrência nunca foi eficazmente denunciada e combatida pela administração pública";
  • 10 - Desvincular IMLs e órgãos de perícia criminal das SSPs.
    Os institutos médicos legais e os órgãos de perícia devem ser desvinculados das secretarias de Segurança Pública, para que tenham maior autonomia e qualidade, além da criação de centros avançados de antropologia forense e a realização de perícias que sejam independentes e autônomas;
  • 11 - Fortalecimento das defensorias públicas
    O objetivo é garantir o "exercício pleno do direito de defesa e a prevenção de abusos e violações de direitos fundamentais, especialmente tortura e maus-tratos";
  • 12 - Melhoria do sistema prisional e do tratamento dado aos presos.
    "Os presídios são locais onde a violação múltipla desses direitos ocorre sistematicamente. (...) É necessário abolir, com o reforço de expresso mandamento legal, os procedimentos vexatórios e humilhantes pelos quais passam crianças, idosos, mulheres e homens ao visitarem seus familiares encarcerados";
  • 13 - Instituição legal de ouvidorias externas no sistema penitenciário.
    "Os ouvidores devem ser escolhidos com a participação da sociedade civil, ter independência funcional e contar com as prerrogativas e a estrutura necessárias ao desempenho de suas atribuições";
  • 14 - Fortalecimento de conselhos da comunidade.
    Os conselhos, que foram criados em uma lei de 1984, devem ter a composição definida em processo "público e democrático";
  • 15 - Garantia de atendimento médico e psicossocial a vítimas.
    "As vítimas de graves violações de direitos humanos estão sujeitas a sequelas que demandam atendimento médico e psicossocial contínuo, por meio da rede articulada intersetorialmente e da capacitação dos profissionais de saúde para essa finalidade específica. A administração pública deve garantir a efetividade desse atendimento";
  • 16 - Promoção da democracia e dos direitos humanos na educação.
    "A adoção de medidas e procedimentos para que, na estrutura curricular das escolas públicas e privadas dos graus fundamental, médio e superior, sejam incluídos, nas disciplinas em que couberem, conteúdos que contemplem a história política recente do país e incentivem o respeito à democracia";
  • 17 - Apoio a órgãos de proteção e promoção dos direitos humanos.
    Fomento a órgãos como secretarias de Direitos Humanos nos Estados e municípios, além de "valorização dos órgãos já existentes --o Conselho Nacional dos Direitos Humanos, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e a Comissão de Anistia".
Além disso, o relatório apresenta propostas de mudanças em leis e de continuidade nas investigações, tais como:
  • 18 - Revogação da Lei de Segurança Nacional.
    "A atual Lei de Segurança Nacional (lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983) foi adotada ainda na ditadura militar e reflete as concepções doutrinárias que prevaleceram no período de 1964 a 1985";
  • 19 - Tipificar crime contra a humanidade e de desaparecimento forçado.
    "O pronto cumprimento do dever de criar um tipo penal autônomo, que contemple o caráter permanente desse crime, até que se estabeleça o destino ou paradeiro da vítima e se obtenha a certificação sobre sua identidade, é fundamental para a coibição do desaparecimento forçado";
  • 20 - Desmilitarização das polícias militares estaduais.
    "A atribuição de caráter militar às polícias militares estaduais, bem como sua vinculação às Forças Armadas, emanou de legislação da ditadura militar. Essa anomalia vem perdurando, fazendo com que não só não haja a unificação das forças de segurança estaduais, mas que parte delas ainda funcione a partir desses atributos militares";
  • 21 - Extinção da Justiça Militar estadual.
    "A desmilitarização das polícias estaduais deve implicar a completa extinção dos órgãos estaduais da Justiça Militar ainda remanescentes. Reforma constitucional deve ser adotada com essa finalidade";
  • 22 - Exclusão de civis da jurisdição da Justiça Militar federal.
    "A Justiça Militar, cuja existência deve se restringir ao plano federal, deverá ter sua competência fixada exclusivamente para os casos de crimes militares praticados por integrantes das Forças Armadas";
  • 23 - Suprimir, nas leis, referências discriminatórias das homossexualidades.
    Um exemplo é o artigo 235 do Código Penal Militar, de 1969, do qual se deve excluir a referência à homossexualidade no dispositivo que estabelece ser crime "praticar, ou permitir o militar que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar";
  • 24 - Fim dos autos de resistência à prisão.
    "Recomenda-se alterar a legislação processual penal para que as lesões e mortes decorrentes de operações policiais ou de confronto com a polícia sejam registradas como 'lesão corporal decorrente de intervenção policial' e 'morte decorrente de intervenção policial', substituindo os termos 'autos de resistência' e 'resistência seguida de morte', respectivamente";
  • 25 - Introdução da audiência de custódia.
    A ideia é garantir a apresentação pessoal do preso à autoridade judiciária em até 24 horas após o ato da prisão em flagrante, em consonância com o artigo 7º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos;
  • 26 - Criar órgão para dar continuidade ao trabalho da CNV.
    A comissão sugere que tal órgão tenha membros nomeados pela Presidência da República, representativos da sociedade civil, que, com a ajuda de órgãos já existentes, como o CNDH, a CEMDP e a Comissão de Anistia, "deverá dar sequência à atividade desenvolvida pela CNV";
  • 27 - Continuidade da busca de desaparecidos.
    O objetivo é dar prosseguimento das atividades voltadas à localização, identificação e entrega aos familiares ou pessoas legitimadas, para sepultamento digno, dos restos mortais dos desaparecidos políticos;
  • 28 - Preservação da memória das violações.
    A comissão sugere instalar, em Brasília, um Museu da Memória. Também pede que sejam revogadas as medidas que, durante o período da ditadura, homenageavam autores de violações de direitos humanos, como nome de ruas e logradouros;
  • 29 - Continuidade à abertura dos arquivos militares.
    Prosseguimento e fortalecimento da política de localização e abertura dos arquivos da ditadura militar.
Diante do exposto e desse sério e expressivo trabalho realizado pelos membros da Comissão Nacional da Verdade é preciso reiterar a necessidade de punição uma vez que os crimes cometidos são considerados crimes imprescritíveis (contra a humanidade) deixando clara a necessidade de revogação da lei de anistia para que os milicos que hoje estão de pijamas e vivendo muito bem com gordas aposentadorias pagas por nós cidadãos sejam julgados e diante de comprovações de seus atos criminosos condenados.

Para tanto, o Estado brasileiro através do seu poder institucional e a sociedade civil precisam se mobilizar não se acomodando com a tristeza de rever os crimes cometidos apresentados no relatório correndo para chorar na cama que é lugar quente. É preciso que seja feita justiça! Chorar diante das câmeras e afirmar que a Comissão Nacional da Verdade é apenas uma investigação histórica sem caráter punitivo é se omitir diante da gravidade dos fatos ocorridos. É jogar no lixo a história de tantos cidadãos brasileiros que literalmente deram a vida por este país. E pior, é se igualar à indignidade dos milicanalhas. Diante de tais fatos não existem argumentos de garantia de governabilidade possíveis de serem sustentados para que punições deixem de ocorrer.

Ademais é preciso ressaltar que esse relatório é parte de uma ampla investigação da nossa história e que precisa continuar não apenas com as Comissões que existem por diversas cidades e Estados do país bem como as realizadas por organizações da sociedade civil e universidades mas também pela própria Comissão Nacional. O trabalho entregue ontem é apenas o início do processo de limpeza da nossa história.

Tal situação se apresenta importantíssima não apenas para a democracia e a sociedade brasileira mas também para os militares fazendo com que não se generalize a barbárie para todos os que serviram à época o exército, a marinha e a aeronáutica. O golpe e os crimes cometidos nunca foram unanimidade nos quartéis militares Brasil afora.

Chega de paz e amor, é preciso termos vergonha na cara e exigirmos punição a aqueles que não honraram a farda que vestiam para proteger o país agindo de forma contrária entregando aos interesses do Norte o Estado brasileiro retirando da presidência João Goulart legitimamente eleito pela maioria do nosso povo e mergulhando a nossa sociedade na escuridão da indignidade, do desrespeito com o cidadão, da corrupção, da falência da educação, do descaso com a saúde, da censura, da perda das liberdades individuais, da violência, da tortura, do desaparecimento, do estupro, do sequestro e da morte por vinte e um anos.

O respeito a uma nação passa fundamentalmente pela clareza de sua história.

Para avançarmos enquanto país precisamos conhecer o passado, para entendermos o presente e vislumbrarmos o futuro.

A luta pelo resgate da dignidade da história do Brasil continua!

Reacionários e assassinos não passarão!

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