Pavilhão Ciccillo Matarazzo. Foto: José Moscardi |
Artistas indignados, que fundaram e participaram de várias exposições desde a fundação da Bienal em 1951, criaram movimentos da arte, foram vanguarda, reinventaram, ganharam prêmios internacionalmente e consagrados pela mídia, concretizaram mudanças fundamentais do conceito contemporâneo na sociedade e na história em mais de meio século, foram excluídos da comemoração 30X Bienal.
Do Blog Arte Inclusiva
A arte tem seus percalços e a injustiça neste segmento é uma exposição ainda invisível na sociedade. “O que deveria ter sido uma escolha respeitando a linha do tempo, fazendo jus à história, transformou-se num recorte com uma visão pessoal e tendenciosa de um só curador”, desabafa Kátia, filha de Ianelli (1922 – 2009).
Dentre
os expoentes consagrados e familiares, estes pertencentes a artistas
que deixaram vivas suas obras, reclamam o desrespeito à arte. Arcanjo
Ianelli marcou a fase do figurativo ao abstrato. Em seu trabalho como pintor,
escultor, ilustrador e desenhista brasileiro, que foi lembrado pelos
seus familiares, participou de nove, com três salas especiais nas
bienais. Concomitante às mostras de São Paulo, na mesma época, foi
detentor dos primeiros prêmios da Bienal do México e de Cuenca. Ianelli,
como era conhecido, integrou o movimento da arte no Grupo Guanabara.
Outro
destaque a este grupo foi o artista Manabu Mabe (1924 – 1997), pintor,
desenhista e tapeceiro japonês. Naturalizado brasileiro, o imigrante
Mabe teve uma infância pobre e começou suas atividades em seu ateliê
adaptado no meio da lavoura do café na cidade de Lins interior de São
Paulo, ele foi um pioneiro do abstracionismo no Brasil. Sua marca revela
vivência nos campos com naturezas-mortas e paisagens. Obteve um grande
êxito, em 1959, das várias exposições consagradas pelo público ao longo
de sua vida, quando ganhou o prêmio como melhor pintor nacional da 5a
Bienal de São Paulo e o de destaque internacional na Bienal de Paris.
Ciccilo (1898 - 1977), um dos principais responsáveis
pela fundação e realização da Bienal de São Paulo. É lembrado como um
ícone pela primeira edição, em 1951, na área do recém-demolido Trianon,
na Avenida Paulista. Naquela época, outros eventos foram integrados à
mostra como a Exposição Internacional de Arquitetura e o Festival
Internacional de Cinema.
Ciccillo Matarazzo presidiu
a Comissão do IV Centenário da cidade. O local escolhido para sediar a
maior parte dos eventos foi o Ibirapuera, onde se planejava construir um
grande parque, e para projetar o conjunto de edificações, em que na
ocasião foi convidado o arquiteto Oscar Niemeyer (1907 - 2012).
Filha
de Ianelli, Kátia se une a artistas para relembrar a história de seu
pai, e sua importância no contexto tão aclamado pela crítica no passado.
Ela diz que a geração de artistas, esquecida nesta comemoração 30 X
Bienal, “fez nascer todo esse movimento naquele tempo, pois era rico e
construtivo. Que explicação há para essas lacunas, essa omissão? As
escolhas seguiram um critério duvidoso de honestidade”, indaga Kátia.
Paulo
Venâncio Filho único curador da Bienal, segundo artistas e familiares,
não respeitou a linha do tempo, nem fez jus à história, transformou a
exposição 30X Bienal num recorte com uma visão pessoal e tendenciosa de
um só curador. Ainda uma pergunta. Qual é o conceito para releitura de
mais de seis décadas de mudanças na arte brasileira?
Entre
1961 e 1971, leciona escultura na Fundação Armando Álvares Penteado -
Faap e, a partir de 1971, na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, ambas em São Paulo. Em 1970, é
eleito presidente da Associação Internacional de Artes Plásticas/Unesco,
e, em 1980 e 1982, melhor escultor brasileiro pela Associação Paulista
de Críticos de Artes - APCA.
No jornal do Estadão, leia aqui, a jornalista Maria Hirszman destaca o ponto de vista do curador em seu artigo: para buscar um maior equilíbrio, o crítico criou para si mesmo algumas regras de conduta.
Caciporé
Torres (1935), de Araçatuba, escultor, desenhista e professor. Artista
excluído da mostra. Viaja para a Europa através de bolsa de estudos que
recebe na 1ª Bienal Internacional de São Paulo, de 1951, e durante dois
anos frequenta os ateliês de escultura de Marino Marini (1901 - 1980) e
Alexander Calder (1898 - 1976). Retorna ao Brasil em 1953, participa de
exposições, e posteriormente, regressa à Europa.
Em
1954, estuda história da arte na Sorbonne, Paris, e trabalha em ateliê
durante 4 anos, período em que desenvolve obra de caráter
abstracionista. Passa a construir formas maciças orgânicas e geométricas
(veja a foto acima), utilizando peças metálicas de aparência
industrial, como o aço, bronze e ferro. Muitas dessas esculturas são
feitas em grandes dimensões e integram museus e espaços públicos de
diversas cidades, como as obras na Praça da Sé, metrô Santa Cecília, e
painel escultórico em Miami, Estados Unidos.
No jornal do Estadão, leia aqui, a jornalista Maria Hirszman destaca o ponto de vista do curador em seu artigo: para buscar um maior equilíbrio, o crítico criou para si mesmo algumas regras de conduta.
Como poderia ser evidente, todo esforço de síntese da história é excludente em uma opinião subjetiva de curador que defende meios ilícitos de galeristas. Reviver a história da arte sem a concretude de sua existência?
Na
mesma ocasião celebridades se unem aos artistas indignados. “ Nossa
solidariedade ao Estadão, que fez justiça ao noticiar, na mesma edição
em que foi capa a mostra 30 x Bienal, o boicote vergonhoso à artista
plástica Maria Bonomi, internacionalmente reconhecida e uma das
fundadoras da Bienal de São Paulo. Lamentável". Defende Aracy Balabanian
e Denise Saraceni.
Cartaz da 1ª Bienal Internacional de São Paulo (1951) |
Maria
Bonomi enfatiza o reviver da história da arte. A artista que nasceu na
Itália e chegou ao Brasil ainda criança, em 1946, definiu o país como o
lugar de "todas as invenções". Bonomi inaugurou com Ciccilo a Bienal em
1951. Fundadora e participante de 12 Bienais lembrou-se da época da
ditadura que viveu, sem ser aceita oficialmente pelo mercado da arte de
seu país. Enquanto muitos artistas fizeram carreira sustentados pela
ditadura, ela preferiu trabalhar na antiga Iugoslávia, na Eslovênia e em
Praga.
No
entanto, nunca deixou de viver no Brasil. "A ditadura era o momento de
ficar, não de sair", comentou. Entre suas obras, a artista destacou uma
primeira colaboração com o arquiteto Óscar Niemeyer, um projeto sobre os
maus-tratos da população indígena brasileira pelos portugueses durante a
colonização. 55 anos de carreira artística,
com gravuras e esculturas em bronze, alumínio e latão, matrizes e
instrumentos de trabalho. Ela recebeu em 1967 um prêmio na Bienal de
Paris.
Maria Bonomi foi um exemplo para as artes e na política. Durante a ditadura militar, a Bienal de São Paulo enfrentou o desconforto do poder político na época. A Fundação Bienal manteve suas relações com o Estado, sustentando regularmente os eventos a cada dois anos, e os artistas passam a procurar formas para contestar a situação.
Maria Bonomi foi um exemplo para as artes e na política. Durante a ditadura militar, a Bienal de São Paulo enfrentou o desconforto do poder político na época. A Fundação Bienal manteve suas relações com o Estado, sustentando regularmente os eventos a cada dois anos, e os artistas passam a procurar formas para contestar a situação.
Conforme
as formalidades já estabelecidas nas edições anteriores, autoridades
políticas estavam presentes na Bienal de 1965. Castelo Branco,
devidamente fardado, é surpreendido com uma carta, entregue por Maria
Bonomi e Sergio Camargo, pedindo a revogação da prisão de intelectuais,
entre eles Mário Schenberg. Iberê Camargo contesta a Fundação Bienal,
“que, na verdade, vive das subvenções dos poderes públicos federal,
estadual e municipal”.
Como já foi pesquisado e evidenciado por historiadores, a preparação do golpe militar no Brasil teve o apoio de elites brasileiras, sobretudo da burguesia econômica e industrial. Esta imposição da sociedade afastou a arte do símbolo da horizontalidade, prestigiando aqueles que detinham o poder. Contudo, a arte passou a fazer parte de um pequeno grupo, de uma elite interessada apenas no mercado industrial.
Como já foi pesquisado e evidenciado por historiadores, a preparação do golpe militar no Brasil teve o apoio de elites brasileiras, sobretudo da burguesia econômica e industrial. Esta imposição da sociedade afastou a arte do símbolo da horizontalidade, prestigiando aqueles que detinham o poder. Contudo, a arte passou a fazer parte de um pequeno grupo, de uma elite interessada apenas no mercado industrial.
Celebrar
uma época da história da arte, de várias exposições, ao longo dos 60
anos que atravessaram dois séculos na sociedade e foram contemplados em
30 bienais, é duvidoso se questionar uma comemoração quando exclui
personalidades que fizeram parte desta história. A questão que implica
nestes tempos, a arte poderia ter sofrido com a influência destas elites
no poder, do conturbado histórico político que as artes enfrentaram no
Brasil? Hoje a resposta para justificar a centralização de um único
curador que defende os interesses de galeristas e exclui a passagem da
história de artistas renomados.
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