terça-feira, 25 de junho de 2013

OS PROTESTOS NO BRASIL

 

Do COADE

É tão difícil, agora, prever a dimensão e evolução dos acontecimentos, quanto era, há um mês, prever a eclosão desses protestos.

Engana-se quem espere, da suspensão dos aumentos, o fim dessa erupção vulcânica. Engana-se qualquer autoridade, seja da Casa Civil do Planalto, seja da Prefeitura de São Paulo, que fale em desoneração de tributos incidentes sobre a prestação desses serviços, ou que fale em exibição de planilhas por parte das empresas permissionárias de transporte: o transporte urbano não pode ser fonte de lucro. 
 
Mas também se engana quem pretenda reduzir, a amplitude desse movimento, a reivindicações tópicas. Em todos esses casos patenteia-se a falta de sensores capazes de medir o nível da insatisfação popular. 
 
Não seria atestado de sensibilidade supor que o problema está, tão somente, na falta de uma política pública de transportes (todos sabemos que as empresas de transporte estão entre os principais financiadores das campanhas eleitorais de vereadores e prefeitos). 
 
Onde escrevi “insatisfação”, poderia ter escrito “sofrimento”. Mas, a partir de uma tradição elitista, nos acostumamos a crer que a paciência popular não tem limites. Um movimento aparentemente sem lideranças, abraçando o mote das tarifas, provocou esse transbordamento difícil de conter, face ao qual emergem algumas certezas.

A Constituição diz, é verdade, que todo poder emana do povo, e será por ele exercido, diretamente ou por meio de representantes. Contudo, quando aí se escreve “diretamente”, não se está pensando em comícios populares, mas nos instrumentos da democracia direta: o plebiscito, o referendo, o recall, etc. Fora desses casos, é com o poder constituinte que se exerce diretamente a soberania popular: promulgada a Constituição, o povo passa a atuar politicamente mediante os canais que para isso reservou: partidos e representantes eleitos. 
 
A atual conjuntura, a cujas preliminares assistimos, é revolucionária porque, indo às ruas, o povo mostra a distância que se pôs entre ele e as instituições. Durante a ditadura dizia-se que era preciso franquear o abismo entre o povo e o governo. E isso continua acontecendo; o povo protesta nas ruas porque não encontra, seja nas agremiações políticas, seja nos órgãos de representação, quem ouça e repercuta sua voz. Pelas mãos de seus proprietários, faliram os partidos; e, com eles, a representação: é a si mesma, a seus interesses, e aos interesses dos seus financiadores, que a classe política atualmente representa. Beneficiária desse sistema, ela não permite que se faça o indispensável: a reforma que transforme os partidos em canais autênticos da representação, e que propicie, aos parlamentares, a independência que perderam. 
 
Por enquanto, alguns sinais de que podemos nos orgulhar: o poder de mobilização das redes sociais; a vitória, sobre a violência, de um pacifismo tão pugnaz quanto lúcido; a derrota do individualismo quotidiano, frente à solidariedade e ao altruísmo. Em ano pré-eleitoral, o povo passa a ditar a agenda política, e sublinha o primado do seu protagonismo.
Sérgio Sérvulo da Cunha é advogado e filósofo. Autor de várias obras e artigos jurídicos,  foi Procurador do Estado de São Paulo, Chefe de Gabinete do Ministério da Justiça do Dr. Márcio Thomaz Bastos, além de Professor de Direito Constitucional e Vice-prefeito do Município de Santos – sua cidade natal.

SIGA O BLOG NO TWITTER!

Nenhum comentário:

Postar um comentário